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O EXECUTIVO E A ARMADILHA DO JUSTO

Por Jansen de Queiroz Ferreira

A motivação para este artigo surgiu durante uma reunião de mentoring com um jovem e promissor executivo, que ficou furioso comigo, quando lhe disse que era pago pela organização para contribuir com sua equipe para o lucro, a segurança e o desenvolvimento da empresa e, não, pretensiosamente, tentar ser justo. A partir deste acontecimento observei que mesmo executivos experientes, com freqüência, ficam prisioneiros dessa armadilha retórica e paralisante. 

Justo nos remete a qualidade Divina, que só os doentiamente pretensiosos têm a veleidade de gastar tempo e dinheiro para tentar essa missão impossível para os seres humanos. Procedem dessa maneira inconscientemente, por possuírem um modelo mental improdutivo, por desconhecer para que são pagos pela organização, por deficiência conceitual, que racionalizam dizendo que a teoria na prática é outra, por falta de coragem moral de admitirem que não conhecem suficientemente bem a teoria para aplicá-la no dia-a-dia. 

Justo equivale segundo o Aurélio: a razão imparcial, reto, exato, homem virtuoso, tudo insinuando divindade. Justiça, grosseiramente, é aplicação da lei genérica a um caso particular. Ela surge das convenções humanas. Classicamente tem dois sentidos: a) dar a cada um o que lhe é devido; b) reparar o dano, indenizando a vítima ou punindo o infrator – Dicionário de Ciências Sociais – MEC-FGV. O Aurélio nos diz, que critério é o que serve de norma para julgar; modo de apreciar coisas ou pessoas. Para não tornar o texto mais longo deixo de colocar para discussão o que possa ser princípio, que muitos confundem com conveniência.

Outro cliente de mentoring, um físico, pesquisador e empresário me questionou se eu ao colocar que é esforço inútil e perda de tempo e de dinheiro procurar ser justo, não estaria fazendo a apologia da tirania. Esta já é amplamente praticada nas organizações. Quantos dos leitores já não ouviram ou pior já sentiram na própria pele a conseqüência da tirânica frase: manda quem pode e obedece quem tem juízo, que tem como objetivo inibir o exercício do direito humano fundamental da expressão do pensamento. A cidadania ainda não chegou à maioria das organizações. Lamentável! A sociedade evoluiu mais rapidamente que as organizações empresariais no que diz respeito à cidadania.

A definição de critério para decidir, para dizer sim ou não, para avaliar o desempenho de seus subordinados e do negócio em si, é que deve ser a preocupação do executivo e, não a preocupação paralisante em está sendo justo ou injusto.

O estabelecimento de critérios requer esforço, trabalho, competência, respeito ao ser humano, ética, desprendimento para limitar seus próprios caprichos. A grande maioria de executivos e de empresários não estabelece critérios de avaliação por que, sem eles, podem manipular a equipe com seus humores, seus caprichos, com seus ataques de fúria ensandecida de arrogância e prepotência. As perdas decorrentes dessa forma de gerir as pessoas e as organizações são irrelevantes para quem tem como único objetivo satisfazer unicamente a si mesmo e como objetivos subseqüentes ele mesmo. Possuem, equivocadamente, a percepção de que a organização lhe concede poder divino. O proprietário do capital, freqüentemente, acha que a empresa é sua. O que com certeza é dele é o capital aplicado no negocio e, se tiver competência, a capacidade gerencial. Os funcionários não são dele, estão trabalhando para a organização, os clientes, os fornecedores e toda a infra-estrutura que utiliza não são dele. Muitos nem se dão conta que têm o pior patrão: o cliente. 

Parcela significativa não possui critérios divulgados e menos ainda compartilhados para validar decisões referentes a objetivos, estratégias, metas, promoção, avaliação de desempenho, treinamento, delegação, aumento de salário, demissão e admissão. Muitos, ainda, admitem por fantasia e demitem por capricho.

Quando perguntado sobre quais são seus objetivos empresariais? Respondem com freqüência: ganhar dinheiro! Falta-lhes a compreensão do dilema financeiro clássico entre a busca da melhor combinação entre as ações de curto e longo prazo e a combinação equilibrada dos objetivos essenciais das organizações empresariais. Executivo ou empresário, a organização lhe paga para construir o tripé da sobrevivência, da segurança e do desenvolvimento, com qualidade de vida da equipe, com responsabilidade social e ecológica. 

A preocupação em tentar ser justo e em não errar, deve ser substituída pela construção de um arcabouço de critérios o mais possível compartilhado com a equipe. Diria mesmo legitimado por todo o grupo. Do contrario, no médio prazo, os executivos, por usarem filtros perceptivos viciados, utilizarão mecanismo de defesa que os protegem da dor de perceber a verdadeira origem do problema. Elaborarão complexo processo para justificar os resultados desastrosos com racionalizações do tipo: a equipe está desmotivada, o achatamento da estrutura acarretou-me excessiva carga de trabalho, estou muito ocupado, não tenho tempo para planejar, organizar, treinar e avaliar a equipe, a culpa é da concorrência predatória, dos juros altos e da abertura do mercado. Desqualificam o melhor dos feedbacks: os resultados obtidos pelo seu estilo de gerenciar a organização, as pessoas e a sua vida.

Jansen de Queiroz Ferreira,

Administrador, Economista, Consultor em Gestão Polifocal, Coaching e Mentoring de empresários, sucessores, executivos e de profissionais autônomos.